Ontem pela manhã estivemos, eu e a Cleci, minha esposa, na feira de ciências da escola de nossos filhos. Tudo muito bem preparado pelos professores, toda a escola envolvida, as crianças empenhadas, ávidas pela atenção dos adultos para poderem repetir seus textos ensaiados sobre o assunto da feira, o planeta Terra, com toda sua biodiversidade, biomas, problemas, soluções e particularidades.
Para a Anna, nossa filha de quatro anos, o tema desenvolvido pela professora Giovanna e toda sua turminha foi “A cidade de Ribeirão Preto”, com seus pontos turísticos, maquetes e histórias diversas, com direito até a um rap composto pelos próprios alunos. Minha princesinha, sempre envergonhada nestas horas, estava linda, fez sua “exposição” e cantou com todos seus amiguinhos a música, na apresentação cheia de pais e avós babando e filmando.
A turma do Biel, no terceiro ano, fez uma apresentação magnífica sobre o Japão, sob as orientações da professora Angélica. Ele ensinava aos expectadores sobre a gestão ambiental daquele pais, e sobre o Tanzaku, os pequenos bilhetes coloridos que as pessoas escrevem seus desejos e os prendem em bambus nas festas japonesas, principalmente no Tanabata. Estes bilhetes são queimados no final da festa e, como nos foi explicado pelo Biel, as cinzas sobem ao céu e, se forem sinceros, as estrelas Altair e Veja realizarão o pedido.
E aí que estava o que mais me chamou a atenção. Segundo nos disse a Angélica, numa conversa posterior, quando os papéizinhos coloridos foram distribuídos para as crianças escreverem seus desejos, ela os orientou que não deviam colocar desejos materiais, mas sim coisas sobre sentimentos e desejos pessoais dos alunos. Usando uma expressão bem popular, o bicho pegou.
Na simples curiosidade de ver o que meu filho teria escrito, comecei a ler os bilhetes, procurando o dele. Fiquei assustado.
“Quero que meu pai não precise viajar muito…”
“Quero que meu pai e minha mão brinquem mais comigo…”
“Eu gostaria que meu pai parasse de beber…”
“Gostaria que meu pai parasse de bater em minha mãe…”
“Queria que minha mãe me desse mais atenção…”
“Eu gostaria que meu pai e minha mãe parassem de brigar…”
Precisei sair da sala e sentar uns minutos, me recompondo do que li naqueles alegres papeizinhos coloridos. Estas frases, por si só, são impactantes. Agora, vindas de crianças de oito anos, foi uma bomba sobre meu coração.
É assim que estamos criando nossos filhos. Primeiro, comprometemos o futuro físico deles, destruindo o planeta, deixando para as próximas gerações uma herança ambientalmente comprometida (tenho que dizer que esta geração de crianças está sendo muito bem preparada sobre consciência ambiental, as causas e conseqüências do desequilíbrio do planeta. Podem se preparar, meus amigos, um dia seremos severamente questionados por ela).
Mas talvez o pior preparo seja o futuro emocional deles. Cada frase transcrita acima carrega uma história particular que é muito mais comum do que gostaríamos supor, um mapa de sentimentos doloridos na simplicidade de uma criança.
Não vou me prolongar muito nestas análises, até por simples despreparo para fazê-las, mas saí da escola refletindo sobre a atenção que damos a nossos filhos, a necessidade de conciliar trabalho, família, lazer e vida em sociedade. Na verdade saí da escola encantado com a feira de ciências, mas triste, muito triste, talvez se não tanto pelo Gabriel e pela Anna, muito por imaginar se os desejos de umas vinte crianças não seriam a síntese de toda uma geração.
Assim, pense bem na próxima vez que disser não ao seu filho quando ele quiser brincar com você, ou em que tipo de exemplo tuas atitudes em relação à família você está “ensinado”.
O tanzaku do Biel, claro, encontrei. “Gostaria que minha irmã fosse menos chata…”
Lawrence Graci
Editor da Revista Nacional de Direito