A solução para combater o assédio moral no trabalho deve partir da vontade social dos trabalhadores. É certo que o meio jurídico tem que se adaptar às inovações, que serão alvo de muitos debates, mantendo-se a urbanidade sem prejuízos à saúde mental dos trabalhadores e o respeito ao princípio da dignidade humana.
Na existência de assédio moral, cabe à direção da empresa intervir, aplicando sanções para que tal episódio não se prolongue e excluindo tal comportamento do convívio diário no ambiente de trabalho. É necessário, inclusive, reinventar a própria gestão da empresa analisando se esta não incentiva o assédio. Metas fixadas podem estimular comportamentos demasiadamente individualistas e competições exacerbadas entre os pares chegando às raias do assédio moral.
A discussão sobre o tema assédio sexual ou moral vem crescendo ao longo dos anos, alcançando o ápice quando a ONU adotou uma Resolução referente às vítimas de criminalidade e de abuso de poder: “entende-se por vítimas pessoas que, individual ou coletivamente, tenham sofrido algum prejuízo, principalmente uma ofensa a sua integridade física ou mental, um sofrimento moral, uma perda material, ou uma injúria grave a seus direitos fundamentais, em virtude de atos ou omissões”.
Inicialmente, foi estabelecido que tal crime, mais comum ou corriqueiro nas organizações, que é o assédio moral, se diferencia, via de regra, do assédio sexual, mas a Resolução é ampla. No seu texto aponta que as vítimas são frutos de abuso de poder. Compartilham do mesmo pensamento a Declaração Americana e a Declaração Universal dos Direitos Humanos: “episódio esporádico não caracteriza o assédio moral. É mister o caráter permanente dos atos capazes de produzir o objetivo de degradar moralmente o empregado”.
Os Direitos Humanos devem ser respeitados sempre, pois inexiste no Estado Democrático qualquer tipo de pretexto legal para a sua violabilidade, desprezo ou inaplicabilidade prática.
Todo e qualquer tipo de abuso de poder ou de autoridade é passível de responsabilidade administrativa, civil e penal. Cabe ao Estado indenizar às vítimas e ofendidos diretos e indiretos, assegurando a inviolabilidade da intimidade, à imagem, à vida privada e à honra das pessoas (inc. X, art. 5º CF/88; indenização e reparação do dano – art. 186/188 CC).
O assédio moral tem uma característica muito peculiar: a humilhação repetitiva e de longa duração, interferindo na atividade do trabalhador. Pode, inclusive, de modo direto, arriscar gravemente a dignidade e as relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, ocasionando na demissão ou, em caso mais extremo, na morte.
As formas mais comuns de assédio moral no trabalho são: sobrecarregar o funcionário de trabalho ou dificultar sua execução; constranger e ameaçar constantemente com demissão; transferir ou rebaixar; falar aos gritos de forma a intimidar utilizando-se da hierarquia; restringir o uso de sanitários estabelecendo o tempo e o número de vezes; submeter a tarefas humilhantes ou degradantes; fazer brincadeiras frequentes e de mau gosto referentes ao sexo, raça, opção sexual ou religiosa, deficiências físicas, problemas de saúde; ignorar a presença; falar apenas com os demais fazendo parecer que este não existe; criticar a vida pessoal na presença de outros colegas; espalhar boatos e fofocas sobre um integrante da equipe; estabelecer metas inexequíveis; questionar a validade dos atestados médicos; proibir que os colegas falem com o trabalhador e este com o seu sindicato; sugerir que peça demissão etc.
Vale lembrar que estas são algumas das formas mais usuais de assédio moral no trabalho, levando em consideração que o assediador inova nas suas formas de atingir a vítima.
Cabe salientar que no serviço público, por sua peculiaridade, o assédio se apresenta de formas sutis: na avaliação de desempenho, nas progressões, nas promoções, na determinação de execução de tarefas com prazos simplesmente impossíveis de cumprir, na retirada de serviços ou das condições materiais para executar o trabalho etc. A vítima é prejudicada na possibilidade de ascensão na carreira, levando-a ao comodismo ou ao estado depressivo, podendo ocasionar em afastamento por licenças médicas.
Mas como resistir e combater tais práticas? Anotar, com detalhes, todas as situações sofridas: dia, mês, ano, hora, local, nome do agressor, testemunhas, reprodução da conversa e gravações no celular. É importante não se deixar abater e, sempre que possível, relatar aos colegas de trabalho ou à família sobre a situação.
Esteja atento a ocorrência de atos injustos ou arbitrários contra si ou contra colegas. A solidariedade é uma arma muito forte, logo, não se isole e nem se afaste da vítima. Fortaleça laços sinceros de amizade; isso favorece a confiança e a capacidade para enfrentar situações adversas no trabalho.
Busque o apoio dos representantes sindicais de forma a evitar conversas entre o agressor e a vítima sem testemunhas. É necessário dar visibilidade à situação a fim de acabar com esta distorção na relação de trabalho.
Dr. João Clair Silveira