Questão altamente indagada nesse último trimestre de 2013 é a do chamado projeto de lei “das biografias”, que libera de forma expressa a publicação de biografias não autorizadas de “pessoa cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública ou esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade.”
Inobstante a importância do tema, é possível desde já detectar que a discussão sobre essa proposta legislativa tem sido feita sob constante erro conceitual de alguns institutos jurídicos. Comumente a discussão travada está na possibilidade de ofensa ou não aos direitos personalíssimos. Citam-se, normalmente e indiscriminadamente, como possíveis direitos a serem violados a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, todos protegidos pelo inciso X do art. 5º da Constituição Federal.
Pois bem, com o pretexto de auxiliar essa discussão, ousamos trazer alguns conceitos que demonstram que intimidade, vida privada, honra e a imagem não se tratam da mesma coisa. Obviamente a distinção é necessária para a correta aplicação do Direito.
Nesse sentido, temos que o traço característico da “intimidade” é a sua perspectiva estritamente pessoal. Vidal Serrano entende que a intimidade é o núcleo mais restrito da vida privada, uma privacidade qualificada, na qual se resguarda a vida individual de intromissões da própria vida privada, tanto do poder público como da sociedade. Até mesmo a própria vida em família, por vezes, pode vir a violar um espaço que o titular deseja manter impenetrável.
Já a “privacidade” diz mais com os interesses individuais e particulares da pessoa. Luciana Fregadolli refere que “vida privada é o direito de excluir razoavelmente da informação alheia ideias, fatos e dados pertinentes ao sujeito. Este poder jurídico atribuído à pessoa consiste, em síntese, em opor-se à divulgação de sua vida privada e uma investigação nesta.”
A “honra” equivale à reputação, à consideração que cada um merece. A honra envolve o meio social, o grupo de pessoas onde se vive. Nelson Rosenvald e Cristiano Farias explicam ser ela a soma dos conceitos positivos que cada pessoa goza na vida em sociedade. Uadi Lammêgo Bulos define-a como um bem imaterial de pessoas físicas e jurídicas. A tutela da honra tem como pressuposto a reputação, o comportamento zeloso e o cumprimento de deveres socialmente úteis pelas pessoas físicas e jurídicas decentes. Trata-se, portanto, de um sentimento de dignidade própria (honra interna ou subjetiva), de apreço social, reputação e boa fama (honra exterior ou objetiva).
Por fim, a “imagem” é aquilo que evoca uma determinada coisa, por ter com ela relação simbólica. Walter Moraes definiu imagem como qualquer elemento representativo de uma pessoa. Compreende-se imagem, além do semblante de uma pessoa, as partes distintas de seu corpo. Hoje em dia há uma ampliação e especificação da ideia de imagem, de forma que também as exteriorizações da personalidade de um indivíduo em seu conceito social fazem parte de sua imagem. É sob esse entendimento que Hermano Duval ensina que o direito à imagem é a projeção da personalidade física (traços fisionómicos, corpo, atitudes, gestos, sorrisos, indumentárias, etc.) ou moral (aura, fama, reputação, etc.) do indivíduo (homens, mulheres, crianças ou bebês) no mundo exterior.
Como se pode ver, parece-nos que apenas com a exata análise conceitual desses institutos poderemos delimitar exatamente quais aspectos do patrimônio moral de uma pessoa pública devem ser protegidos contra a exposição coletiva, pois certamente seus direitos personalíssimos, em alguma extensão, merecem proteção.
Arnaldo Rizzardo Filho – Advogado
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