Juíza gaúcha destaca o modelo francês de prevenção
Maurício Macedo
Ao longo de quase 20 anos de atuação, o Serviço Central de Prevenção da Corrupção (SCPC) do governo francês vem elaborando mecanismos para detectar, prevenir e reprimir este tipo de crime dentro do setor público. Ligado ao Ministério da Justiça da França, o órgão também tem buscado estreitar os laços com outros países de forma a evitar a ocorrência de casos internacionais de corrupção.
Em dezembro de 2012, o SCPC promoveu curso de capacitação na Escola Nacional da Magistratura francesa, em Paris. Durante uma semana, foram apresentadas as ferramentas técnicas e jurídicas utilizadas para combater a corrupção na gestão administrativa e judiciária.
A atividade contou com a participação da juíza federal Cristina de Albuquerque Vieira, da 3ª Vara Criminal de Porto Alegre. Além dela, estiveram presentes procuradores e juízes do Brasil e de outros países emergentes, especialmente do continente africano.
No curso, os participantes puderam conhecer um pouco mais do papel das autoridades francesas e dos organismos internacionais, bem como o modelo de prevenção da corrupção no setor privado e o ponto de vista da sociedade civil e de organizações não governamentais. “Eles mostraram que para detectar e prevenir a corrupção, que são crimes muito complexos e cometidos às escuras, é necessária dedicação exclusiva”, ressalta a juíza gaúcha.
Dirigido por um magistrado, o SCPC é um organismo interministerial autônomo, criado em 1993, capaz de centralizar as informações e propor iniciativas que aprimorem o combate aos crimes de corrupção. “Não investigam fatos isolados. O objetivo deles é institucionalizar os critérios de forma a prevenir que este tipo de delito ocorra dentro da máquina pública”, explica.
Cristina destaca que o surgimento do órgão acompanhou uma tendência de internacionalização, lançada pela Comunidade Europeia (que antecedeu a União Europeia). “Há essa preocupação em coibir a prática criminosa de empresas francesas que atuam em outros países”.
Segundo ela, com relação às questões jurídicas, “a realidade brasileira não está aquém da francesa”. “O Brasil tem evoluído bastante. Temos utilizado instrumentos de investigação semelhantes aos de outros países, como é o caso do sigilo nos processos e o uso das interceptações telefônicas”, observa.
Por outro lado, a juíza aponta que, na França, a investigação de delitos de corrupção costuma ser desencadeada quando o crime ainda está sendo praticado. “Por aqui, ela ocorre normalmente após a consumação, o que dificulta a condenação dos criminosos”. Na avaliação dela, o maior entrave é a “cultura brasileira” que, muitas vezes, inclui a corrupção entre os delitos de menor gravidade.
Os ensinamentos obtidos no curso francês serão compartilhados, em breve, com outros magistrados do Brasil. Cristina e o juiz Alexandre Jorge Carneiro da Cunha (que também esteve na França), da 1ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, gravarão uma vídeo-aula que será disponibilizada, até o começo de março, no site da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam).
Fonte: Jornal do Comércio (RS)