“Que tipo de lugar é este, onde você quase pretende o que diz? Onde as leis quase valem? Como vocês podem viver assim?” O desabafo acima é do escravo Joseph Cinque, no filme Amistad (1997), de Steven Spielberg. Mas poderia ser de qualquer servidor da PGE, no ano de 2014.
Está em curso hoje, na instituição, uma política clara e definida: a absoluta desvalorização do servidor. O servidor é tratado pela Casa como fruto de um serviço social efetuado pela instituição, no sentido de permitir que membros da patuleia convivam, nos mesmos ambientes, com seres superiores: os procuradores.
Não há qualquer reconhecimento, a não ser em discursos, da importância do servidor para o funcionamento da Casa. A forma pela qual o Gabinete enfrentou a greve, no ano passado, foi um claro demonstrativo disto: as medidas mais rigorosas e desumanas foram tomadas, ignorando as necessidades dos servidores. Para a administração da PGE, o que estava sendo enfrentado não era uma greve de servidores, mas uma rebelião de escravos, que devia ser debelada com a mais absoluta truculência.
Dentro desta política de não reconhecer o servidor como parte da instituição, mas como um mero serviçal, destinado apenas a cumprir sem questionar o que lhe é ordenado, o Plano de Carreira dos Servidores (Lei n. 13.380/2010), que visa a valorização do quadro de serviços auxiliares da Casa, surge como um entrave: como aplicar uma lei que faz justamente o oposto do que a filosofia do gabinete da PGE prega?
O resultado são os processos de promoções de 2012 e 2013. Os regulamentos que disciplinam os processos de promoções não são claros, permitem várias interpretações, as quais sempre são feitas em desfavor dos servidores. Em 2012, um colega notou uma falha na lógica do processo de promoções dos servidores, que permitiria a ascensão de mais de uma centena. De modo a não dar provimento a recurso – claramente procedente -, o Gabinete não hesitou em prejudicar todas essas pessoas e mais outras tantas, negando-lhes claro direito à promoção.
Este problema poderia ter sido parcialmente reparado com o processo de 2013, o que foi alertado por este Sindicato em todas as oportunidades em que o assunto foi tratado. Porém, a administração da Casa optou por fazer apenas progressões, arruinando de vez o Plano de Carreira. A alegação é de que o Plano de Carreira dos servidores deve que progredir de forma lenta, de modo a não desmotivar os servidores. O mesmo critério, nem de longe é aplicado aos procuradores, já que há casos de procuradores que atingiram as classes final e superior em cinco anos de PGE. Ou seja, novamente, ao procurador não há problema de cumprir a carreira de forma meteórica, mas ao servidor isto provocaria desmotivação.
O fato é que, em pouco mais de três anos gerindo o plano de carreira dos servidores, o Gabinete da PGE conseguiu seu intento de implodi-lo, tornando a carreira de todos muito mais lenta do que deveria ser. É cruel e desumano, mas dialoga com a política da atual gestão de jogar no lixo o servidor da Casa, enquanto exalta o procurador.
Cícero Ulkowski Corrêa Filho
Diretor do SINDISPGE/RS (Sindicato dos Servidores da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul)